Este post não tem unidade, nem fio condutor, consciente.
Eu precisava voltar a escrever, e não encontrava nunca um tema (nem tempo para me forçar a estabelecer um).
Então, vou reunir alguns parágrafos soltos. Espero que ao menos eles sejam interessantes individualmente.
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Café, o “vinho dos sufis”, é uma bebida complicada.
O primeiro café esquenta e anima. Para aqueles cujo único contato com ele é essa primeira injeção de ânimo, é tudo o que ele faz.
No entanto, ele tem um efeito secundário para os de nós que continuam a ingeri-lo: ele passa a esfriar.
Este segundo efeito é uma faca de dois gumes: ele passa a retirar a animação (e todos os bebedores de café sabem disso) e até deixar a pessoa mais triste, ou mais recolhida.
No entanto, continua secando — o que ajuda na concentração mental. Se o primeiro gole dá energia, o segundo dá clareza mental, às custas de tomar energia de volta.
E, claro, tudo o que é frio e seco aumenta o que os antigos chamavam de humor melancólico — diminuem a velocidade dos processos corporais. Desconfio que seja por isso que café em excesso faça mal ao estômago.
Até onde me lembro, Culpeper nunca escreveu sobre café, mas me parece uma planta marcial-saturnina. Um gostinho de Capricórnio para as manhãs frias.
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Recebo de vez em quando a pergunta “A morte pode ser considerada um assunto de casa quatro?”
Minha resposta padrão é “bom, vários textos antigos sugerem isso, mas nunca fez sentido para mim, e faz menos sentido ainda usar duas casas para significar a mesma coisa”.
E não estou mentindo — mas eu gostaria de expandir o raciocínio.
A associação entre a casa quatro e a morte vem de ela ser o ponto mais baixo do mapa, o Fundo do Céu.
E, bom, o mais comum é mortos serem enterrados, irem para o fundo, para o ponto mais baixo — ou, pelo menos, para um ponto abaixo do Horizonte.
Sendo o ponto associado à posição do Sol à meia-noite, quando ele está mais longe de nós, e quando termina o dia, ela também está associada ao fim das coisas.
Então, há alguma relação, certo?
Bom, certo… mas tem dois problemas aí.
O primeiro problema é que o enterro não é a morte, é o que acontece depois dela, na maior parte dos casos. Por este ângulo, a casa quatro seria mais associada — como é — ao túmulo, não à morte.
O segundo é que “fim das coisas” significa exatamente isso: o fim de todas as coisas, de ciclos, vidas, validades de ketchup, etc. A morte é um fim muito específico. E, bom, as pessoas não morrem e imediatamente voltam à vida, como o Sol faz ao passar pela casa quatro.
Por outro lado, a associação (que nenhum dos textos, mesmo os que apontam também para a casa quatro, nega) entre a morte e a casa oito é muito mais específica.
Em primeiro lugar, por ser justamente a casa oito — a primeira casa depois da sete.
Há sete planetas, e um dos seus possíveis significados conjuntos é completude. E eles dividem, especificamente, a vida humana em sete idades. Ela vem depois deste ciclo — que se refere especificamente ao ser humano. Como as casas têm co-significadores (O Ascendente é co-significado por Saturno, a casa dois por Júpiter, etc), o seu é Saturno, a segunda vez que o planeta das portas e das trancas aparece. Na primeira vez, ele aparece no Ascendente, nossa porta de entrada no mundo; na segunda, faz sentido que seja na porta de saída.
Além disso, do ponto de vista mais prático e mundano, a morte é algo ruim. A casa oito é uma das quatro que não observam o Ascendente, e uma das três que são consideradas maléficas (porque a dois, sendo anexa e inferior ao Ascendente, é sua “serva”, e portanto não o aflige); destas três, é a que está oposta ao Ascendente e o aflige “de cima” (enquanto as doenças, casa seis, o afligem “de baixo” e o autossabotamento, casa doze, está “grudada” no Ascendente). O que nos aflige, e sobre o qual nada podemos fazer porque é uma “ordem de cima”: a morte.
Na ordem das casas, a oito é a primeira que não tem contato com a terra. Todas as outras estão abaixo do Horizonte ou (o Descendente) começam nele. É o fim, como dizia aquela banda, da aventura humana na Terra.
Por último, ela é a casa entre estas primeiras sete e a casa nove, das peregrinações, viagens longas, estudos superiores e religião. Todos os seus significados têm um componente “do alto”; ela é, em mais de um sentido, o que acontece depois da morte.
“Isso significa que podemos ignorar a casa quatro nestes assuntos?”
Hum… não. Em horárias, sim. Em astrologia natal, embora o foco ainda seja a casa oito (e o significador natural dessas coisas, Saturno), eu não me fecharia a esta possibilidade, porque o céu mostra para a gente as coisas com as armas que tem disponíveis no momento.
Uma pessoa, aliás, me disse que fez uma pesquisa com mapas de gente morta e muitas das mortes aconteceram em profecções de casa quatro. Claro que não se prevê morte só com isso (e quem me conhece há algum tempo sabe que eu não aconselho a se prever morte), mas é um dado interessante, e vale a pena ficar de olho.
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Em algum livro, acho que no “Símbolos Fundamentais da Ciência Sagrada”*, René Guénon comenta a semelhança entre o símbolo de Câncer e o símbolo Yin-Yang.
Entender o simbolismo do signo a partir da imagem consagrada que o representa é fazer o caminho no sentido inverso… mas isto não quer dizer que seja uma má ideia.
No entanto, não quero falar do Yin-Yang. Quero mencionar outra imagem que “as duas garras do Caranguejo” evocam (até há um certo “ar oriental” nisto): dois peixes nadando.
Para mim, na verdade, o símbolo parece mais dois peixes nadando num círculo, como duas carpas, do que duas garras.
E, bom, já temos um signo de peixes, mas cuja imagem evoca (ou deveria evocar) dois peixes unidos por um cordão, para não se perderem — é o signo mutável, instável, da água.
Mas esta não é a única possibilidade do elemento. Ele pode ser fixo, como Escorpião, ou cardinal, como Câncer.
Cardinal é o início da ação. Para os signos de fogo e de água, o signo jovem (o primeiro a aparecer no Zodíaco) coincide com o signo cardinal, o que sugere que eles começam quando a vida humana começa. A terra e o ar já “estavam por aí” quando nascemos, a terra como a inesgotabilidade fixa do jardim de delícias que é Touro, o ar como a recepção de informações já prontas dos adultos no signo das trocas que é Gêmeos.
Mas quando nascemos, nasce em nós a capacidade de agir, fogo, e a capacidade de sentir e desejar, água.
Duas carpas girando ao redor de um centro não-material, ordenadas, limitadas tanto por este centro quanto pelos limites seguros do seu lago, fazem mais sentido do que parece. Os sentimentos e desejos com os quais nascemos não são um turbilhão, não nos podem causar problemas ainda; ao contrário, sem eles morremos de fome, de frio, de sede. Câncer são os sentimentos e desejos que nascem junto conosco, e são mantenedores da vida até a nossa morte. É a água segura, sem a tensão fértil mas perigosa de Escorpião, nem as consequências criativas mas indefinidas de Peixes.
Claro, não é uma ordem fixa, nem clara; a água (os peixes, nesta imagem, “são parte da água”), gira, conduzida pelo lugar em que está. Ainda pode ser perturbada pelo vento; ainda pode estagnar; e, claro, ainda pode girar rápido demais.
Mas, pelo menos para mim, é o mais perto de “estável” que uma imagem de água movente pode sugerir. Agua estagnada não é estável, ela está apodrecendo, e gelo é água apenas materialmente.
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O mar parece prolongar o Ascendente indefinidamente.
Sim, o horizonte anda conosco. Mas num campo aberto, ele parece parado. A terra sugere extensão indefinida, não movimento.
O horizonte no mar é uma regressão indefinida, como se ele remontasse ao início dos tempos, como se ele não fosse o horizonte daquele lugar, mas do Cosmos.
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Uma vez eu disse, meio brincando, que o que temos de mais próximo da materia-prima no nosso mundo são as fezes, o excremento.
Sim, é uma imagem baixa, e eu peço desculpas — mas tem razão de ser.
Os excrementos são o que sobra do alimento, depois que o corpo absorveu tudo o que poderia dele, e não se trata só de absorção de matéria; precisamos de formas diferentes na nutrição, como (embora não com essas palavras, claro), qualquer profissional da saúde pode confirmar.
Na verdade, fezes são nojentas porque ainda têm forma; os restos do que não conseguimos digerir (e o cheiro, aparência, etc, não é só delas, mas dos garis microscópicos que tentam completar o serviço).
Em algum ponto do processo, a matéria acaba sendo usada por outras formas, ela é “reinformada”. É uma parte meio nojenta, mas essencial, do tal do “ciclo da vida”.
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Eu escrevi no Instagram, de passagem, sobre a conjunção Marte-Urano-Algol que aconteceu agora. Na ocasião, recomendei o vídeo (na verdade, é uma série de vídeos, abrangendo vários anos no futuro, que ele fez há um tempo) do Celio Barros, que analisou o mapa com mais profundidade.
Pouco depois, Donald Trump toma um tiro de raspão na orelha. Bom, uma pessoa compartilhou o meu story, associando-o ao evento.
Fico muito feliz, mas é claro que não previ nada disso — só disse que a conjunção parecia ruim (o que qualquer sujeito com mais de duas semanas de estudos de astrologia diria) e apontei umas coisas no mapa da conjunção para Brasília (a imagem que me passou, a princípio, nada tinha de violenta neste sentido — me parecia sugerir problemas econômicos, antes de mais nada).
Além disso, o atentado aconteceu, na verdade, antes da conjunção ocorrer.
Por último, crianças, não façam isso em casa: trânsitos são muito limitados, Marte transita absolutamente tudo no mapa de vocês a cada dois anos, e não faz sentido se desesperar com isso.
MAS, depois do acontecido, é difícil não lembrar que esta conjunção acontece a menos de 2 graus do Meio-Céu do Homem Laranja.
Por outro lado, também aconteceu a menos de um grau de oposição do regente do meu Ascendente, e cá estou, com as duas orelhas intactas.
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É isso, por enquanto. Um abraço e fiquem todos com Deus.
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Eu tenho alguns cursos gravados no Gumroad.
Você comentou que o post não tinha uma ordem consciente, porém o que o texto, como um todo, me invocou foi a manhã. A manhã menos como símbolo geral e mais como circunstância concreta. Os temas parecem ser os que a manha invocam e a onde eles estão mais claros, ou que nós estamos considerando eles de forma mais ativa, ou como parte do nosso cenário. Muito bom!